terça-feira, 15 de novembro de 2011

...o dia em que quase morri (continuação)...


…no hospital, depois de vários exames, comecei a recuperar a visão lentamente. Depois de nuvens de luz, comecei a ver vultos e posteriormente a conseguir distinguir os rostos das pessoas.
Deram-me alta assim como as duas priminhas mais pequenas, que não sofreram nada, ao contrário da mãe delas que ficou com um fractura exposta.
O meu pai, fiquei a saber mais tarde, tinha partido vértebras na coluna cervical, mas por sorte não afectaram a medula, a minha mãe partiu o externo e 8 costelas, ficaram os três adultos internados.
Eu tinha na altura por volta dos 19 anos, era o único maior de idade com duas crianças e os pais no hospital.
Fomos transferidos para outro hospital, num centro urbano maior e supostamente com melhores condições. Chegamos ao hospital em Coimbra, entretanto entramos em contacto com familiares e o pai das meninas que apareceu mais tarde.
Sem possibilidade de fazer nada, com os meus pais e prima no hospital, fomos para o centro da cidade e alugamos quartos no hotel.

Tomei um banho quente antes de me deitar, refiz os acontecimentos do dia na minha mente, enquanto a agua corria quente sobre a minha cabeça e corpo, envolvendo os meus sentimentos e as lágrimas que corriam do meu rosto.

Tinha sido um dia demasiado longo, mas a noite iria revelar acontecimentos ainda mais emocionantes.

Acordei, banhado por uma luz que emanava de todo o quarto, “já é dia” disse para mim.
Olhei para me situar, do lado esquerdo um candeeiro distribuía uma luz ténue mas forte ao mesmo tempo sem se tornar insuportável, como quando acordamos e levamos com luz forte e a nossa visão leva tempo a acostumar.
Ainda do lado esquerdo, encontrava-se a porta de saída do quarto, de onde saía uma luz imensa pelas frestas da mesma. “Quem é que acedeu esta luz toda”, lembro-me de ter dito isto, meio incomodado por já estar acordado.
Do lado direito ficava situada uma janela que dava para a rua, cuja a persiana estava corrida, mas mesmo assim davam para passar pelos buracos da persiana mais luz intensa, que eu imaginei ser do Sol.
Tinha o quarto banhado de luz por todo o lado, mas não fiz questão de me levantar ou mexer, deixando-me ficar a preguiçar por momentos no calor letárgico da cama.
Nesse entretanto, pressenti uma maior intensidade de luz vinda da porta do lado de fora do quarto.
Pensei, “alguém está a tentar abrir a porta do quarto para entrar ou para me vir acordar”.
Virei-me para o lado esquerdo e comecei a tentar que o meu cérebro digerisse o que estava acontecer.

Ao principio pensei que estivesse a ficar ofuscado pela luz que emanava da porta que tinha sido aberta, mas na realidade o que eu via era um vulto que estava iluminado por luz, cujo o rosto eu não conseguia distinguir. Começou lentamente a dirigir-se para mim.
Eu forçava a visão para conseguir distinguir o rosto do que se estava a aproximar.
Tentei falar para perguntar quem era, o que estava a fazer ali, mas só ouvi o som vazio da minha voz. Comecei a entrar em pânico, o meu pensamento fervilhava de emoções misto de medo e perplexidade, “ainda não recuperei de um acidente e já me vai acontecer mais uma” disse para mim.

Foi quando me tentei mexer, talvez saltar da cama e fugir pela porta, talvez atacar ou defender-me antecipando o que iria acontecer.
Do pânico surgiu um terror que se começou apoderar de mim, nenhum dos meus membros reagia ao comando da minha mente, estava paralisado foi a única sensação que tive naquele momento.
Pior do que não ver, nesse dia, era o que eu via nesse momento.
Sem poder mexer, falar ou gritar só podia assistir incrédulo aos acontecimentos presentes.
A forma fantasmagórica continuava a aproximar-se de mim lentamente, da direcção da porta até ao meu lado esquerdo, depois começou a contornar a cama, sem nada dizer, passou pelos pés da cama e foi para o lado direito da cama, sempre a olhar para mim, os seus olhos fitando os meus, o seu rosto parecia não ter forma ou ser formado de uma matéria mutável de aspecto que era impossível de distinguir.
Aproximava-se lentamente do lado direito depois de ter contornado toda a cama, até chegar perto da minha cabeceira.
Tentei fechar os olhos, mas não consegui. Tentei observar melhor aquela pessoa, adivinhar o que iria fazer ou o que fazia ali e o porquê de tudo aquilo.
Olhei o corpo dele, parecia vestir algo de branco e luminoso, de ladrão que pensava que ia me roubar, passou para santo ou anjo que me ia levar dali, que eu tivesse morrido devido aos ferimentos que não foram bem observados no hospital e eu estava morto.
Mas eu conseguia ver tudo ao meu redor, o pormenor do papel de parede e a sua textura, os cortinados abertos, eu deitado na cama, os lençóis e cobertor que me cobria, o tapete no chão a mesinha de cabeceira com o candeeiro por cima com a luz ligada, como podia sentir, ver, cheirar tudo isso e estar morto ao mesmo tempo??!!!...
Então a forma fantasmagórica começou a aproximar-se de mim, o seu rosto tranquilo, a sua boca num sorriso acolhedor, pareceu que iria me beijar, “um homem que eu não conheço de lado nenhum vai me beijar”, foi ai que o pânico se instalou totalmente….

Ouvi a sua voz pela primeira vez, não soube distinguir se eram os seus lábios que emitiam o som e os meus ouvidos que o captavam, ou se era a minha cabeça, ou a minha imaginação ou o que quer que fosse, mas ouvi perfeitamente ele dizer suavemente, tranquilizando-me “Olá, está tudo Bem!!!”…

O quarto ficou na maior penumbra, “onde estava a luz que ainda agora iluminava tudo??! Onde estava a pessoa que falou mesmo agora comigo???!! A janela que tinha luz a sair das persianas, a porta do quarto aberta??!!! O que aconteceu exactamente aqui???!!” a minha mente fervilhava de perguntas sem resposta.

Consegui levantar e ligar o candeeiro que supostamente estaria ligado.
Fiquei a observar todo o quarto para ter a certeza que tinha ou estava mesmo a ver aquele local e não teria imaginado ou sonhado tudo aquilo.
Mas estava lá tudo, o papel de parede texturado, o tapete no chão, os lençóis, cobertores a cama tudo no seu mais ínfimo pormenor…

Nunca contei nada disto a ninguém, com medo que fosse considerado louco, ou que a pancada na cabeça do acidente fosse mais grave do que eu pensei, mas isto aconteceu para mim de tal maneira real, que não tenho dúvidas nenhumas que é in’realidade…

3 comentários:

  1. Que relato impressionante! Não sei que conclusão tiraste dessa experiência, mas sei o que imaginei de imediato! ;) Curioso... Recordo-me que a primeira projecção consciente que tive aconteceu numa cama de hospital, na noite seguinte a um acidente que me deixou temporariamente sem visão... dois anos depois! :P

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  2. Sabes, o mais interessante é que eu antes disso já tinha tido várias projecções, sabia o que era, mas esta foi "catalepsia projectiva" nunca tinha tido. Foi assustador, sentir o corpo e não o conseguir mexer. Tudo era demasiado real. Os sons os cheiros os pormenores, a lucidez imensamente intensa. Só anos depois, quando entrei na lista, percebi o que tinha acontecido. Em relação a ter projecção lúcida depois de um trauma intenso, tenho duas teorias, uma física e outra nem por isso. A física, no meu caso, foi o embate frontal, em que bati exactamente com a testa no vidro, provocando fisicamente uma contusão na cabeça, atrofiando o nervo óptico, daí a cegueira temporária. Nesse embate, além de ter desmaiado, o meu "eu" foi cuspido brutalmente do carro, tendo aquela "visão" do que estava acontecer. A minha teoria física, é que de alguma forma, o embate tenha provocado uma abertura temporária de ligações sinápticas no cérebro, dando origem ao meu relato, além de libertação de químicos, devido ao trauma em si (instinto de sobrevivência). A minha "outra" teoria, é mais relacionada com um patrocínio. Depois de um trauma como este, é nos dado vislumbrar algo maior que está para vir... ;)

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  3. A minha teoria anda por aí algures...! ;) a minha segunda experiência foi exactamente um ano mais tarde e de catalepsia projectava... Também após um trauma, mas diferente.

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